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A MP 961/2020 e as dispensas de licitação durante o estado de calamidade pública pelo coronavírus

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A MP 961/2020 e as dispensas de licitação

Não é de hoje que as dispensas de licitação representam enormes riscos de corrupção para as compras e aquisições públicas brasileiras.  

Porém, com o advento da Lei nº 13.979/2020, que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do coronavírus (COVID-19), diversas notícias estão sendo veiculadas abordando quebra de compliance, tanto pelas empresas que ofertam produtos por preços infinitamente superiores aos praticados por elas mesmas poucos meses atrás, aproveitando a situação para aumentar suas margens de lucro, quanto pelas ordens de compras dadas por gestores públicos, que autorizam a contratação de empresas com histórico de irregularidades e/ou suspeitas de práticas ilícitas, sem qualquer tipo de cuidado prévio e a preços exorbitantes.

Para ilustrar o exposto, citamos a matéria veiculada pelo portal UOL Notícias, no último dia 23, que aborda a compra realizada por dispensa de licitação pelo Governo do Estado do Amazonas, de 28 respiradores para o tratamento de infectados pelo coronavírus, com sobrepreço de 316%.

Se não bastasse tamanha disparidade de preço, os referidos foram considerados “inadequados” pelo Conselho Regional de Medicina do Amazonas – Cremam.

Isso porque, de acordo com os especialistas consultados, os respiradores adquiridos pelo governo amazonense não servem aos pacientes diagnosticados com COVID-19, já que estes “precisam de ventilação invasiva”, necessitando de “respiradores adequados de maneira constante”.

A matéria completa poderá ser acessada neste link.

Dentre tantas outras, verificou-se outra matéria, agora veiculada pelo portal de notícias da Globo – G1, no dia 14/04/2020, informando sobre a abertura de inquérito pelo Ministério Público do Rio de Janeiro – MPRJ, para analisar se os poderes Executivo e Legislativo estão agindo com transparência nas contratações emergenciais durante o período de pandemia de coronavírus.

De acordo com a reportagem, o inquérito busca investigar a decisão da Secretaria de Estado de Saúde do Rio de Janeiro de tornar sigilosos e retirar do Sistema Eletrônico de Informações da Secretaria, documentos relativos à compras emergenciais para o combate à pandemia no estado, no valor total de R$ 835 milhões (clique aqui para ler a matéria).

Ainda no Rio de Janeiro, observa-se que até o início de abril, haviam sido gastos R$ 1 bilhão em contratos por dispensa de licitação pelo Governo Estadual e sua quase totalidade (R$ 836 milhões) foram destinados para a Organização Social Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde (Iabas) que está proibida de participar de licitações do município do Rio de Janeiro, por conta de descumprimentos de contratos, erros administrativos e desvios de recursos públicos. Matéria disponível aqui.

Medida Provisória nº 961, de 6 de maio de 2020

Feita as considerações acima,  passa-se a analisar agora a Medida Provisória nº 961/2020, recentemente publicada para autorizar pagamentos antecipados em licitações e contratos, adequar os limites de dispensa de licitação e ampliar o uso do Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC durante o estado de calamidade pública decorrente do coronavírus.

Desse modo, observa-se que a MP em comento aumenta os limites de valores de dispensas de licitação para obras e serviços de engenharia de R$ 15 mil para até R$ 100 mil, bem como para outros serviços e compras de R$ 8 mil para até R$ 50 mil.

Além disso, prevê regras para o pagamento antecipado nas licitações e contratos pela Administração, desde que este: a) represente condição indispensável para obter o bem ou assegurar a prestação do serviço; ou b) propicie significativa economia de recursos.

A MP nº 961/2020 indica, ainda, que o órgão licitante, quando for realizar o pagamento antecipado, deverá prever a antecipação em edital, ou em instrumento formal de adjudicação direta,e exigir a devolução integral do valor antecipado na hipótese de inexecução do objeto.

Para tanto, a norma aponta diversas cautelas que poderão ser utilizadas para reduzir o risco de inadimplemento contratual, como:

a) a comprovação da execução de parte ou de etapa inicial do objeto pelo contratado, para a antecipação do valor remanescente;

b) a prestação de garantia nas modalidades de que trata o art. 56 da Lei nº 8.666, de 1993, de até 30% do valor do objeto;

c) a emissão de título de crédito pelo contratado;

d) o acompanhamento da mercadoria, em qualquer momento do transporte, por representante da Administração; e

e) a exigência de certificação do produto ou do fornecedor.

Vejam que a norma em comento não exige/obriga a utilização, mas, sim, recomenda o emprego de medidas aptas a mitigar os riscos envolvendo pagamentos antecipados em licitações e contratos durante o estado de calamidade pública pelo coronavírus, dando certa margem de discricionariedade ao gestor público.

De todo modo, colacionamos o entendimento consolidado do Tribunal de Contas da União – TCU a respeito da matéria (Acórdãos nº 1341/2010 – Plenário e 4143/2016 – Primeira Câmara), no sentido de existirem três requisitos mínimos para a realização de pagamentos antecipados pela Administração, quais sejam:

1 – Previsão no ato convocatório;

2 – Existência, no processo licitatório, de estudo fundamentado comprovando a real necessidade e economicidade da medida; e

3 – Estabelecimento de garantias específicas e suficientes, que resguardem a Administração dos riscos inerentes à operação.

Desse modo, entendemos que o chefe do Executivo Federal, ao editar a Medida Provisória em comento, deveria exigir/obrigar e não apenas “recomendar” as cautelas e garantias necessárias aos pagamentos antecipados, consoante entendimento consolidado pelo Tribunal de Contas da União – TCU.

Boas Práticas relacionadas às aquisições e contrações públicas por dispensa de licitação durante a pandemia da COVID-19

Nesse sentido, observa-se a recente publicação da Cartilha de Boas Prática de Integridade nas Relações Público-Privadas em Tempos de Pandemia, pela Controladoria-Geral da União – CGU, que apresenta diversas recomendações às empresas nas operações realizadas juntos ao setor público, que tenham por base as medidas adotadas excepcionalmente em razão do coronavírus.

A referida cartilha informa que todas as empresas podem e devem contribuir para que as ações que estão sendo e serão realizadas, sejam pautadas pela integridade e transparência.

Em relação a Santa Catarina, verifica-se que o Tribunal de Contas do Estado – TCE/SC, disponibilizou em seu site um guia com perguntas e respostas com o intuito de orientar os gestores públicos nas ações administrativas voltadas ao combate da COVID-19.

Tal documento indica como os administradores públicos deverão proceder em contratações temporárias de pessoal em situações de emergência e calamidade pública, bem como em casos de aquisições e contratações públicas, gestão fiscal e consórcio público, fornecendo um verdadeiro norte aos gestores públicos e contribuindo para não ocorrência de violações normativas/legais.

O documento em comento poderá ser acessado no endereço: http://www.tce.sc.gov.br/sites/default/files/coronavirus_perguntas_e_respostas.pdf

Um outro ponto que merece destaque no estado catarinense refere-se à Prefeitura de Balneário Camboriú, que instituiu recentemente através do Decreto nº 9907/2020, um comitê para o acompanhamento e monitoramento de todas as compras públicas relacionadas ao enfrentamento da pandemia de coronavírus,  corroborando, assim, ao fortalecimento de seus controles internos, transparência e compliance. Em relação à administração pública municipal, frisa-se que esta foi pioneira e está em processo de implementação de um Sistema Antissuborno ISO. A matéria completa poderá ser acessada clicando aqui.

Ainda em Santa Catarina, observa-se a recente publicação do “Guia de Procedimentos e de Identificação dos Principais Riscos em Aquisições e Contratações Diretas destinadas ao enfrentamento da COVID-19”,  que tem por objetivo fornecer orientações aos órgãos e entidades no âmbito do Poder Executivo do Estado de Santa Catarina, no que concerne aos procedimentos a serem adotados nas compras e contratações por dispensa de licitação, destinadas ao enfrentamento da situação de emergência de saúde pública decorrente do coronavírus.

Infelizmente, é preciso esclarecer que, especificamente no que se refere a Santa Catarina, a despeito da publicação dessas orientações, notícias apontam suspeitas de irregularidades em dispensas de licitação do Governo Catarinense, como a realizada para a compra de 200 respiradores para atender pacientes da COVID-19. Quanto a esse episódio, em recente coletiva, o Controlador-Geral do Estado confirmou a existência de fragilidades no procedimento administrativo realizado para a compra dos respiradores e riscos quanto à entrega desses equipamentos.

Voltando às Boas Práticas, observa-se que muito recentemente a Transparência Internacional – Brasil e o Tribunal de Contas da União – TCU lançaram “Recomendações para Transparência de Contratações Emergenciais em Resposta à COVID-19”, destinadas a todos os estados e municípios brasileiros, com o objetivo de reduzir os riscos de corrupção em contratações de emergência.

Uma outra iniciativa que merece destaque, é a realizada pelo Ministério da Saúde, que incluiu em seu site a página “Contratos Coronavírus”, onde estão reunidas informações sobre as aquisições de bens, serviços e insumos por dispensa de licitação, garantindo, assim, a transparência necessária nesse tipo de contratação/aquisição.

Vale registrar ainda a existência de importantes iniciativas dos Órgãos de Controle para o recebimento de denúncias envolvendo fraudes/corrupção em aquisições e contratações públicas por dispensa de licitação, como o Fala.BR , disponibilizado pela Controladoria-Geral da União – CGU e o canal disponibilizado pela Controladoria Geral do Estado de Santa Catarina – CGE/SC.

Por fim, observamos com atenção as recentes flexibilizações conferidas pelo Executivo Federal através das diversas Medidas Provisórias editadas, que, apesar de possuírem força imediata de lei e serem pertinentes ao momento que estamos passando, poderão ter sua eficácia suspensa para análise de constitucionalidade, como vem ocorrendo recentemente com a MP nº 954/2020, que dispõe sobre o compartilhamento de dados por empresas de telecomunicações com a Fundação Instituto Brasileiro de Geografia Estatística – IBGE.

Outrossim, apesar das recentes flexibilizações conferidas pelo Executivo Federal, sugerimos aos gestores públicos que baseiem seus atos observando os princípios expressos e implícitos que deverão ser obedecidos por toda a Administração Pública – especialmente, o da legalidade, da supremacia do interesse público, motivação e publicidade dos atos administrativos.

No que tange às empresas, sugere-se que estas tomem todos os cuidados necessários atentando-se para a pertinência do objeto licitado com o enfrentamento da pandemia, bem como o possível histórico de irregularidades, fraudes e corrupção que o órgão licitante possa estar envolvido ou ter se envolvido no passado.

Noutras palavras, mesmo que a Administração Pública demonstre flexibilização em seus controles internos quando a contratação tiver caráter emergencial, as pessoas e organizações privadas não estão isentas de manterem hígidos seus controles e políticas antissuborno e anticorrupção, salvaguardando seus ativos (tangíveis e, mesmo, os intangíveis, como marca, imagem e posição de mercado) da implicação em manobras ilícitas que possam acabar comprometendo sua sustentabilidade.

Nesse sentido, publicamos recentemente o artigo “A Integridade e as contratações públicas emergenciais durante a pandemia da COVID-19”, onde elencamos diversas medidas aptas à mitigar os riscos envolvidos nas dispensas de licitação durante o período de calamidade pública que estamos passando, tanto para a Administração Pública, quanto para as empresas privadas.

Não deixe de conferir o artigo, clicando aqui!

Um abraço e até a próxima!

***

Uma resposta

  1. Parabéns pelo artigo Thiago, esclarecedor, diria mesmo que é educativo, mas, infelizmente retrata uma realidade que está longe de acabar nestas terras de Cabral.

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